Com o passar dos anos e com a legalização sendo encaminhada em diversos países, é cada vez mais comum observar diferentes grupos que antes estigmatizavam a maconha agora estarem fazendo consumo da erva.

Um destes grupos são os idosos. Em 2018, a Associação Americana dos Aposentados, que reúne 30 milhões de membros, fizeram uma pesquisa que mostrou que os estadunidenses idosos acreditam que a maconha possui efeitos medicinais, é eficiente no combate à dores, para melhorar a falta de apetite, controlar a ansiedade e deveria ser disponibilizada sob supervisão médica. 

Fonte: Healthline

Em contrapartida, a pesquisa também mostrou que 60% são contra o uso da maconha sem fins medicinais, 64% são favoráveis a um estudo financiado pelo governo para avaliar com precisão seus efeitos sobre a saúde e 70% afirmaram que consideram a hipótese de consumir maconha se tiverem um quadro para o qual a cannabis trouxer algum tipo de alívio. 

Nesse artigo, iremos discutir as possíveis vantagens e desvantagens do uso de cannabis por pessoas da terceira idade e também investigar de quais formas a maconha e os idosos se encontram em sua estigmatização. Afinal, idosos não precisam usar maconha para aliviar dores ou sintomas e a maconha pode estar ali para relaxar e divertir.

Maconha medicinal: Afinal, faz bem?

O uso da cannabis para efeitos medicinais no Brasil ainda é uma realidade distante e a erva encontra muito preconceito. Por aqui, os medicamentos feitos a base de canabidiol são liberados e funcionam com excelência no controle da epilepsia, mas ainda precisam ser importados e custam muito caro, tornando a solução inacessível para boa parte da população. Com o Projeto de Lei 399/15 apresentando um parecer favorável à legalização do cultivo no Brasil, exclusivamente para fins medicinais, veterinários, científicos e industriais da Cannabis sativa, esta pauta avança a passos extremamente lentos no Brasil.

Além do uso medicinal, o uso pessoal e recreativo da droga também é uma realidade entre os idosos em outros lugares do mundo. O uso da erva já havia dobrado de 2015 para 2019 nos Estados Unidos entre idosos, chegando a 5% da população acima de 65 anos sendo usuária, e a previsão é que o número tenha aumentado ainda mais durante a pandemia.

Não há dados detalhados e diretos sobre o aumento do uso entre idosos desde a pandemia, mas a Associação Nacional da Indústria da Cannabis dos Estados Unidos fez estudos que mostram que o aumento da venda de cannabis no país aumentou em 20%. Para muitos, a maconha é vista como uma forma de escapismo, ansiolítico, relaxante e no contexto em que vivemos, isolados, isso tem se tornado uma alternativa atraente para muitas pessoas, incluindo os idosos.

No Brasil, a relação da população com a maconha é diferente da relação criada pelos norte-americanos. Aqui a discussão sobre a legalização nem se aproxima da pauta sobre uso recreativo e já é considerado algo polêmico. Nos faltam dados para analisar o uso da maconha pela população que não seja num viés incriminatório e sim de pesquisa e informação. É um fato que a erva vem sendo usada para o alívio do sintoma de várias questões de saúde que acometem os idosos. Estudos de pesquisadores da Universidade do Sul da Flórida apontaram a eficácia do uso da maconha para combater a Doença de Alzheimer, a principal doença neurodegenerativa responsável pela demência. Segundo o estudo, doses pequenas de THC (substância química presente na cannabis) diminuem a concentração de uma proteína, beta-amilóide, que é uma das causadoras da doença. Além disso, o THC junto a outro princípio ativo, o CBD, já foram apontados como eficientes no combate de várias outras enfermidades neurológicas, que tendem a acometer idosos, tais como: Doença de Parkinson, Esclerose Múltipla, Transtornos do Espectro do Autista. 

Assim, tanto o THC quanto o CBD podem ter efeitos positivos nos seguintes sintomas: agitação, ansiedade (quando em doses baixas), agressividade, depressão e dor. Além disso, ambos atuam na neuroproteção e na redução da formação de placas senis. Individualmente, o tetraidrocanabinol alivia tanto a insônia quanto a anorexia e ameniza a perda de memória, enquanto o canabidiol, atuando sozinho, auxilia apenas na psicose.

Pesquisadores liderados por Andreas Zimmer, da Universidade de Bonn, na Alemanha, administraram baixas doses de THC a camundongos jovens, maduros e idosos. Como esperado, camundongos jovens tratados com THC tiveram um desempenho um pouco pior em testes comportamentais de memória e aprendizagem. No entanto, sem a droga, camundongos maduros e idosos tiveram pior desempenho nos testes do que os mais jovens. Mas depois que os animais idosos receberam THC, seu desempenho melhorou a ponto de ficarem parecidos com os de ratos jovens não tratados. “Os efeitos foram muito robustos, muito profundos”, diz Zimmer.

Esse estudo é muito interessante e reforça a ideia de que há diversas vantagens no uso da erva mas é importante alertar que o estudo não foi feito com humanos e não há garantia em estender esse raciocínio para os idosos. As descobertas levantam a possibilidade intrigante de que o THC e outros canabinóides possam atuar como moléculas anti-envelhecimento no cérebro. Os canabinóides incluem dezenas de compostos biologicamente ativos encontrados na maconha sendo o THC o grande responsável pelos efeitos psicoativos da erva. Os compostos vegetais imitam as moléculas semelhantes à cannabis do nosso cérebro, chamadas canabinóides endógenos, que ativam receptores específicos no cérebro capazes de modular a atividade neural.

A maconha tem risco para os idosos?

Com esse volume de estudos apontando os bons efeitos da maconha na vida de um idoso, é importante também estar atento aos riscos e cuidados que devem ser tomados ao fazer o uso da erva. Oito pesquisadores da Universidade de Duke-NUS, em Singapura, examinaram a arquitetura funcional do córtex cerebral de 57 jovens e 72 idosos e constataram que os mais velhos apresentaram perda da segregação funcional, isto é, a habilidade de encaminhar o processamento de determinados processos para regiões específicas e conectadas entre si, o que se traduziu em pior desempenho em todos os testes realizados.

Um outro estudo foi feito, realizado pela equipe da Amen Clinics, do Google, da John Hopkins University, e dos centros da Universidade da Califórnia em Los Angeles e San Francisco, onde o abuso do uso da maconha demonstrou uma aceleração no envelhecimento do cérebro em 2,8 anos. É importante ressaltar que o estudo não carregou um viés discriminatório ou moralista, o próprio psiquiatra responsável pelo estudo, Dr. Amen, disse não se opor a descriminalização da droga mas defende um estilo de vida saudável, sem fumar, beber e comer de maneira balanceada para manter o cérebro ativo e com saúde. Também é importante ressaltar que o estudo apontou isso para o uso abusivo da maconha e que se for usado com cautela, tais riscos não precisam ser alarmantes. Mas ainda existem questões psiquiátricas inseridas nessa equação.

Para Alessandra Diehl, psiquiatra e vice-presidente da Associação Brasileira de Estudos Sobre o Álcool e outras Drogas (ABEAD), essa questão é tratada num capítulo intitulado “Uso de maconha entre idosos: um velho novo problema” da obra “Maconha: prevenção, tratamentos e políticas públicas”.

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Foto: Herb

“É consenso que os idosos usam drogas prescritas ou não, ilícitas ou legais, as quais podem ser catalisadoras ou agravantes de outras doenças mentais. Esse é um problema grave, sobretudo se considerarmos que a previsão é de 15 milhões de idosos com transtornos psiquiátricos para 2030 em decorrência das mudanças na pirâmide demográfica”, diz Alessandra.

Essa psiquiatra traz uma questão importante mas que deve ser enxergada como algo inserido num viés da saúde mental e que de fato existem cenários em que a cannabis pode ser um agravante para essas pessoas, ultrapassando a questão etária mas a terceira idade é uma fase delicada e por si só demanda muitos cuidados. Diversas questões acerca dessa fase da vida estão rodeadas de tabu e estigmas impostos pela sociedade, então é importante destacar que ser idoso não impossibilita ninguém de viver sua liberdade da forma que bem lhe agrada.

Uso recreativo na Terceira Idade

Entre argumentos negativos e positivos, a questão é que houve, de fato, um aumento no uso da maconha entre os idosos e existem diversas razões possíveis para isso. As mais apontadas e evidentes são a flexibilização da legislação em diversos lugares e o fato de que a geração idosa agora acompanhou o estouro da maconha como símbolo de rebeldia e liberdade nos anos 60/70. 

Fonte: Forbes

Quando o assunto é uso recreativo das drogas, a discussão sempre fica mais delicada, como destacamos anteriormente, e ao inserir isso num grupo que requer mais cuidados deixa a discussão mais complicada.

Existe toda uma geração que hoje é velha mas que no passado viveram revoluções e participaram da contracultura, existem pessoas que foram reprimidas por muito tempo e encontraram na velhice a possibilidade de se libertar de certas coisas que o passado e a vida adulta impuseram. 

Retomando o início do artigo, houve um aumento no uso da maconha entre os idosos nos últimos anos e, com certeza, o uso recreativo está inserido nesse aumento. Enxergar os idosos como enfermos que precisam estar sempre cuidando da saúde e isentá-los de seres que buscam diversão e lazer é uma forma de preconceito, não é mesmo? Assim como associar o uso da maconha a um uso abusivo e prejudicial é uma visão preconceituosa, associar idosos a pessoas debilitadas de saúde física e mental também é preconceito.

A expectativa de vida vem aumentando cada vez mais com o avanço da medicina e no Brasil, de acordo com o IBGE, a população idosa cresce em ritmo acelerado e passou de 19,5% no período entre 2012 e 2017. Acredita-se que, até 2060, os idosos vão chegar a uma expectativa média de 81 anos e representar 32% da população brasileira – sendo que em 2013 ocupavam apenas 13% da pirâmide demográfica. Os idosos estão cada vez vivendo de forma mais tranquila e é preciso assumir que dentre os riscos que existem em diversas atividades recreativas, a maconha pode ser só mais uma delas, com seus riscos e vantagens, idosos merecem usar algo que pode relaxar e deixar tudo mais divertido.

Talvez o mais relevante nisso tudo seja pensar a importância de enxergar a cannabis em sua forma mais natural e despretensiosa: mesmo tendo as incríveis propriedades que tem, os riscos que apresenta, ainda se mantém como algo muito menos danoso que diversas drogas legais e aceitas por toda a sociedade. Idosos têm o direito de tomar uma cervejinha, fumar um beck, tomar um chá de cogumelo ou o que for para viver melhor e tornar as coisas mais gostosas no fim do dia. O importante é se cuidar, manter a saúde e SEMPRE fazer o uso de tudo na vida com moderação.

E você, qual é sua opinião sobre a maconha e seus usos? Já a utilizou de alguma forma? Tem alguma dúvida? Deixe seu comentário abaixo!