Já notou como a Geração Z, os nascidos após os anos 2000, adoram um vape que traz uma vibe bem cool, moderna e tech? 

À medida que os vaporizadores se estabelecem como parte da cultura contemporânea, refletindo preferências pessoais e inovação, surge uma ameaça mais complexa e menos visível, atingindo camadas profundas da saúde de seus consumidores: o impacto do Spice, uma substância sintética de potência notável, sobre o mercado de líquidos para vapes. 

Desenvolvido para imitar os efeitos da cannabis, o Spice apresenta riscos muito maiores do que sua contraparte natural. Com o crescimento dos relatos sobre sua detecção em produtos de vape, o Spice atrai atenção alarmante, destacando a importância do aumento da conscientização contra falsos produtos à base de maconha sintética e o fortalecimento das regulamentações neste mercado. 

Parte de um problema maior relacionado a líquidos de vape não regulamentados, muitas vezes anunciados contendo THC ou cannabis.

Do que é feita a Droga Spice?

Em um incidente em 2006, dos muitos que podemos ver na ciência, o químico orgânico John Huffman teve participação ativa em nosso conhecimento sobre o que identificamos com Spice. Enquanto buscava novas abordagens para o desenvolvimento de medicamentos anti-inflamatórios, Huffman deu vida a uma substância que, anos mais tarde, seria declarada imprópria para consumo humano — pelo próprio inventor.

Esta substância se posicionou no mercado de drogas recreativas para imitar os efeitos da cannabis, de forma muito perigosa. Conhecido como a droga “zumbi” devido aos seus efeitos debilitantes — que incluem:

  • psicose;
  • perda de movimento;
  • vômito ou diarreia;
  • convulsões.

O Spice é composto por substâncias químicas artificiais chamadas SCRAs, que são feitas em laboratório para imitar os efeitos da cannabis. Porém, ao contrário da maconha, o Spice pode ter efeitos imprevisíveis e prejudiciais. Além disso, é produzido em laboratórios ilegais, onde não há controle ou informações claras sobre como é feito.

Diversas substâncias podem ser classificadas como Spice. Algumas versões possuem uma estrutura química muito semelhante à encontrada na maconha in natura e na resina de cannabis, enquanto outras têm apenas uma semelhança estrutural parcial com a molécula de THC (o composto psicoativo da cannabis). 

Essas substâncias atuam nos receptores canabinóides, principalmente localizados no cérebro, para produzir seus efeitos. Até agora, centenas de canabinoides sintéticos foram identificados na Europa.

Comumente, o Spice é vendido em pacotes contendo plantas secas que foram borrifadas com a solução da droga. Após secar, o material vegetal pode ser fumado com tabaco. A droga pura também pode ser misturada a líquidos para vapes.

spice na mão

Imagem: Jorge Alberto Mendoza Mariscal/iStock via Getty Images

Descoberta acidental da Droga Spice e o perigo real

Em um incidente em 2006, dos muitos que podemos ver na ciência, o químico orgânico John Huffman teve participação ativa em nosso conhecimento sobre o que identificamos como Spice. Enquanto buscava novas abordagens para o desenvolvimento de medicamentos anti-inflamatórios, Huffman deu vida a uma substância que, anos mais tarde, seria declarada imprópria para consumo humano — pelo próprio inventor.

Consequências não intencionais de uma Inovação

A história de como substâncias concebidas inicialmente para fins médicos acabam se tornando drogas de rua são consequências não intencionais do rápido desenvolvimento tecnológico atual. Assim como o ecstasy ou o LSD, os canabinoides sintéticos representam o exemplo mais recente de uma substância originada na pesquisa médica que se transformou em uma droga de uso recreativo alarmante. 

“Aqui é onde tudo começou,” disse Marilyn Huestis, investigadora sênior no Instituto Nacional sobre o Abuso de Drogas, a uma entrevista publicada no Washington Post.. “É assim que começou. E é muito triste que isso tenha acontecido. Eles agora estão a todo vapor… John está muito angustiado que tudo isso tenha acontecido.” O trabalho de Huffman é apontado como o marco inicial dessa transformação no consumo de drogas feitas em laboratório, destacando um percurso inesperado de descobertas científicas para o abuso dessas substâncias de forma degradante. 

A trajetória acadêmica de Huffman até o Spice

A vida de Huffman foi dedicada à pesquisa e ao ensino. Nascido em Evanston, no Estado de Illinois, ele sempre se interessou por química e medicina. Após se formar doutor pela Universidade de Harvard, passou quase toda a sua carreira na Universidade de Clemson, onde criou quatro filhos, casou-se três vezes e publicou todas as pesquisas de química sintética que pôde ainda em vida.

Nesta mesma época, grandes descobertas aconteciam no mundo das drogas sintéticas. A reação biológica desencadeada pela maconha no corpo humano sempre foi um mistério. Os cientistas conseguiram dissecar o componente ativo da maconha — o THC —, modificar sua estrutura e criar compostos sintéticos baseados nisso.

No entanto, não sabiam se o THC atuava por meio de interações não específicas com as membranas celulares ou se interagia com os receptores sensoriais do cérebro, que leem mensagens neuroquímicas e instruem as células sobre o que fazer. 

Então, no final dos anos 1980, veio a descoberta de algo chamado receptor canabinoide, confirmando a última das teorias. Esse era o sistema estimulado pelo THC. Mas era muito mais do que isso.

O sistema endocanabinóide e a relação da manutenção do cérebro

A pesquisa evidenciou o vínculo crucial entre o bom funcionamento de nosso sistema endocanabinóide e a relação íntima da manutenção do cérebro. Ações que os humanos carregam desde os primeiros dias da evolução, que modulam coisas como a função motora, o apetite e a memória. Assim, pesquisadores começaram a sintetizar novos compostos para ver como o receptor reagia a eles.

Foi nessa época que Huffman tomou conhecimento da pesquisa e ficou extasiado. Suas descobertas de compostos sintéticos interagiam com o receptor canabinóide exatamente como o THC, mas não se pareciam em nada com o THC. 

Um quebra-cabeça científico, como o receptor canabinóide funcionava?

A única maneira de descobrir era examinando suas interações com diferentes compostos sintéticos. Assim, Huffman pôs mãos à obra. Financiado pelo National Institute on Drug Abuse, ele produziu centenas de canabinoides sintéticos. 

Esses compostos que Huffman criou eram ferramentas farmacológicas — ferramentas que podemos usar para entender o que está acontecendo no cérebro. Ele criou uma linha inteira de produtos químicos. A cronologia exata do que aconteceu a seguir é difícil de determinar. O que se sabe, no entanto, é que Huffman sintetizou um composto chamado JWH-018 em 1993 e publicou a fórmula em uma série de artigos, periódicos e um livro chamado “The Cannabinoid Receptors”.

Não está claro qual artigo os químicos clandestinos usaram, quando o encontraram ou quem eram. Mas, no final de 2008, os compostos que tiveram origem no campus da universidade em que John trabalhava foram identificados em um laboratório de pesquisa na Alemanha. Os fabricantes haviam borrifado o canabinoide sintético em folhas de plantas e vendido isso — junto com vários outros canabinóides — sob o nome de Spice. 

Do laboratório para a internet

Apenas dois anos após sua invenção, essa substância começou a aparecer em diversos sites, sendo comercializada sob o disfarce de incenso ou fertilizante para plantas. A transição do ambiente controlado de um laboratório para o vasto e incontrolável mercado online marcou o início de uma era preocupante para essa descoberta acidental.

A nova droga foi comparada à cannabis por alguns, devido às suas propriedades relaxantes e alteradoras da percepção espacial. No entanto, outros usuários relataram experiências que lembram os efeitos alucinógenos, como o do LSD, indicando uma variação significativa nas reações individuais e destacando a experiência traumática com sua utilização. 

Em 2017, o cenário se tornou ainda mais preocupante com o surgimento de uma forma cristalina da substância, até  20 vezes mais potente que a cepa comercializada na época.

Mas onde a Droga Spice é produzida?

Atualmente, não existem informações detalhadas sobre o processo de fabricação dessas drogas em laboratórios secretos, no entanto, há algumas noções de como o Spice pode ser produzido, devido a experimentos acadêmicos divulgados em revistas científicas.

Esses estudos buscam identificar o método de produção do Spice e possíveis impurezas presentes, auxiliando cientistas a analisar amostras reais para mapear rotas de tráfico de drogas.

Os compostos do Spice atuam de forma mais intensa nos receptores canabinóides do nosso corpo do que a cannabis, ampliando seus efeitos. Além disso, os subprodutos desses SCRAs, uma vez metabolizados pelo corpo, podem se ligar novamente aos receptores canabinóides, prolongando o impacto da droga. 

O uso repetido pode levar ao desenvolvimento de tolerância, exigindo doses maiores para alcançar o efeito desejado e aumentando o risco de danos.

Efeito da Droga Spice nos usuários

Inicialmente explorados como drogas experimentais para aliviar o sofrimento relacionado a várias condições, os SCRAs se ligam mais fortemente aos receptores canabinóides do que os compostos encontrados na cannabis, resultando em efeitos psicotrópicos mais intensos e duradouros.

Muitos buscam no Spice uma experiência semelhante à da cannabis, mas se deparam com uma lista extensa de efeitos colaterais desagradáveis, como tontura, problemas cardíacos e respiratórios, convulsões, agravantes na saúde mental, além de danos aos rins e problemas gastrointestinais.

Ao consumir a erva, sempre que possível, dentro da sua realidade, opte pela compra de flores onde possam ser identificados os galhos, e suas ramificações. A chance de consumir um produto que não contenha K2/Spice é bem menor.

Fontes: